16/02/2016
Notícias.

Há talentos no setor público no Brasil, mas são poucos

Marcos Mendes Foto: Reprodução Stefano Martini/ÉPOCA

O site da Revista Época publicou nesta terça-feira um artigo sobre talentos e bons exemplos no setor público brasileiro. Um dos perfis apresentados é de José Moulin Netto, aluno do Master em Liderança em Gestão Pública – MLG, programa de pós-graduação oferecido pelo CLP. Leia o artigo na íntegra:

Numa entrevista de emprego em 2014 com o então secretário da Casa Civil da prefeitura do Rio de Janeiro, Pedro Paulo, José Moulin Netto disse que promoveria inovações caso fosse contratado como o novo presidente do Instituto Fundação João Goulart. O órgão foi reaberto em 2012 com a difícil missão de treinar burocratas e formar líderes na prefeitura do Rio de Janeiro, numa tentativa de buscar quadros talentosos para posições estratégicas dentro da prefeitura e com isso economizar recursos públicos. Pedro Paulo, hoje chefe da secretaria-executiva de coordenação da prefeitura, convenceu-se, e José Moulin ganhou a vaga.

Moulin tem longa experiência na iniciativa privada. Ganhava muito mais nessa época, prestando consultoria em vários países e para diversas empresas – nas dos outros e nas que ele próprio criou e depois fechou. Quis presidir a fundação, entre outros motivos, porque se sentia em dívida com a cidade, por ter se formado engenheiro na Universidade Federal do Rio de Janeiro – sem jamais pôr de pé um telhado. Uma experiência bem sucedida no setor público também lustraria seu currículo.

“Uma das coisas que aprendi na carreira privada é que de nada adianta ter um plano sensacional se ele não é executado", afirma Moulin. Foi assim que ele levou, para a prefeitura, as técnicas de convencimento que aprendeu no exercício da consultoria. Abusando da persuasão, ele incrementou o programa Líderes Cariocas, de treinamento de funcionários públicos, sejam eles concursados ou comissionados, criado por Pedro Paulo. Os candidatos a líderes da administração pública passam por um árduo processo seletivo e devem trabalhar em cada projeto inovador por até seis meses. Eles despontam dentro da administração pública, são batizados de Líder Carioca e ficam no radar de secretários e chefes de repartições públicas na vacância de uma função chave. Os melhores projetos ganham prêmios.

Um dos projetos elogiados pelos avaliadores, fruto do trabalho de quatro funcionários da prefeitura, visava desburocratizar a emissão de alvarás na cidade. Hoje, é possível imprimi-los em casa, num sistema completamente informatizado. O projeto agradou tanto que o subsecretário de Ordem Pública, Bruno Bondarovsky, ele próprio um Líder Carioca, recrutou Eduardo Almas, um dos autores do projeto, para trabalhar na pasta e ajudar a tornar a ideia realidade. Almas tem mais de dez anos de carreira na prefeitura. Naquele momento, ocupava o cargo de coordenação de gestão administrativa de um hospital na Gávea, onde “apagava incêndios todos os dias”, não “tinha a menor chance de crescer” e onde não havia “a cultura do planejamento”. Ao migrar de pasta, Almas ganhou 30% de aumento de salário.

A divulgação do programa, dos projetos desenvolvidos e dos seus líderes fez com que o primeiro escalão municipal procurasse Moulin atrás de nomes para preencher vagas em suas pastas. Ronald Munk, presidente da RioSaúde, uma empresa pública responsável por gerenciar quatro unidades hospitalares da prefeitura do Rio, foi o primeiro deles. Ele queria um líder carioca capaz e disposto a assumir o desafio de preparar a empresa pública para administrar hospitais no município, em 2014. Moulin lembrou-se na hora de Almas e o indicou. Almas trocou a secretaria da Ordem Pública pela RioSaúde em busca de desafios. Ao superá-los, ele agradou Munk, que o promoveu a assessor e lhe deu um novo aumento, de 14%. A Moulin, coube uma nova função, a de headhunter – caçador de talentos – da prefeitura.

Treinar talentos que já pertencem à burocracia é o caminho mais seguro para tornar a máquina administrativa eficiente. As políticas públicas beneficiam-se se elas são executadas por gestores com capacidade técnica, que sabem o que fazem – e por que fazem. Por terem carreiras mais longas e estáveis, são eles que permanecerão a cada troca de governo, a cada eleição. Se treinados na arte da negociação e da conciliação de interesses políticos dissonantes, esses técnicos contribuirão para manter ou aperfeiçoar uma política pública importante ,independente da coloração ideológica do governante. “No Brasil, isso ainda é incipiente e a regra é o loteamento partidário”, afirma Nelson Marconi, professor da Fundação Getúlio Vargas e especialista em administração pública. “A imensa troca de funcionários a cada quatro anos – porque temos o absurdo de mais de 20 mil cargos de confiança – é um grande problema, porque mata o DNA de políticas públicas importantes”, diz Luiz Felipe D’Ávila, presidente do Centro de Liderança Pública.

Um exemplo de descontinuidade ocorreu em Minas Gerais. Quando governou o estado, o senador Antonio Anastasia, do PSDB, criou os cargos de empreendedores públicos – uma iniciativa inspirada no Chile – para garimpar executivos talentosos dentro da administração pública. Se desempenhavam bem suas missões, eles eram designados para o comando de obras ou programas públicos.  Anastasia promoveu Eliane Parreiras, uma empreendedora pública da Cultura, a secretária da pasta, a partir dos resultados que ela obteve na execução de projetos e obras voltadas à cultura mineira. Outra iniciativa louvada por especialistas foi a certificação de talentos interessados em ingressar na carreira pública a partir de uma parceria entre o estado e a Universidade Federal de Minas Gerais. Depois de serem aprovados em rigoroso processo seletivo, eles eram considerados aptos a disputar postos-chaves na administração, fosse na saúde ou educação. Os dois programas foram descontinuados ou readaptados na gestão do petista Fernando Pimentel. Um dos motivos, diz o atual governo, é que a certificação custa caro – e o Estado não tem recursos para continuar bancando o projeto.

Iniciativas como a carioca ou a mineira são louváveis, mas são como água no deserto. São exemplos raríssimos de tentativa de atração e de formação de gestores qualificados no setor público no Brasil. O país peca por não compreender a urgência da questão. Nos Estados Unidos, ao contrário, faz anos que o governo sabe que apenas 2% dos egressos universitários têm interesse em concorrer a vagas no setor público. É um problema enorme porque o número de funcionários em idade de se aposentar na burocracia americana só aumenta. Por isso, métodos criativos para seduzir funcionários talentosos e futuros líderes proliferaram na burocracia americana na última década – e os resultados têm sido inspiradores.

Criado em 2010, o Challenge é um portal que recruta talentos que queiram enfrentar desafios colocados pelo governo americano – um deles pede que cientistas desenvolvam um projeto inovador de teste diagnóstico, com o objetivo de identificar infecções bacterianas. Para cada desafio solucionado, o governo paga milhões de dólares em recompensas. O do diagnóstico de infecções vale um prêmio de US$ 20 milhões. A competição entre os interessados é enorme. Desde que o site foi criado, o governo desembolsou mais de US$ 220 milhões e realizou 640 desafios, dos quais participaram mais de 250 mil candidatos.

Projetos em plataformas de internet e de dados passaram a ser prioridade dos americanos para seduzir bons quadros técnicos e inovadores.Outro exemplo é o USA Jobs. Trata-se de uma das mais sofisticadas plataformas de emprego público do mundo. Centenas de vagas em aberto dentro do governo americano estão ali. O Departamento de Assuntos de Veteranos, por exemplo, procura um radiologista cardíaco. Além de apelar ao patriotismo para seduzir candidatos a cuidar de veteranos de guerra, o governo promete na descrição da vaga um salário anual de US$ 345 mil  ao radiologista – um ganho mais alto que o do vice-presidente Joe Biden, que recebe US$ 230 mil anuais. Agências governamentais também usam redes sociais ou promovem feiras de desenvolvimento de projetos para atrair novos talentos. Em Singapura, onde a maior parte dos quadros é treinada internamente, o governo lançou aplicativos para anunciar vagas e atrair potenciais candidatos às poucas vagas de livre provimento.

A ausência de quadros qualificados na administração pública é uma ameaça à continuidade de programas e projetos eficientes para a sociedade. A perda de talentos para a iniciativa privada – onde os salários são maiores e os bônus mais polpudos – obrigou, felizmente, vários governos mundo afora a rever a carreira dos burocratas de estado. Os exemplos internacionais deveriam ser replicados ou adaptados à realidade do Brasil, onde a estratégia de sedução de quadros, afora as raras exceções, é insípida. Aqui,  ainda prevalece a visão de que a administração pública é mero cabide de empregos. É uma cultura que repele talentos que poderiam contribuir – de dentro do setor público – para o desenvolvimento do país.

Confira o artigo na íntegra no site da Revista Época.

 

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