19/09/2018
Notícias.

Existe uma estratégia nacional para a Educação?

O CLP conversou com o Diretor de Políticas Educacionais no Todos pela Educação, Olavo Nogueira Batista Filho. Ele, que também é líder MLG, falou sobre os desafios da educação brasileira e os propósitos do movimento, criado em 2006, com o objetivo de engajar o poder público e a sociedade no compromisso pela efetivação do direito de crianças e jovens a uma educação básica de qualidade.

“Apenas com a implementação de uma estratégia sistêmica, que reconheça o que precisa ser continuado e aprimorado e ao mesmo tempo consiga introduzir novas medidas necessárias, conseguiremos avançar de maneira significativa.  Esse deve ser o ponto de partida do próximo governo federal.”

Quais são os principais desafios da educação no Brasil?

O principal é o desafio da aprendizagem. Superamos, em grande medida, o desafio do acesso. Sim, ainda temos 4% de crianças e jovens de 4 a 17 anos fora da escola, mas a maioria está lá. O grande problema é que poucos têm aprendido em níveis adequados. Ainda que tenhamos progredido, os avanços são lentos e pouco sistêmicos. Melhoramos nos anos iniciais do ensino fundamental, mas com pouca repercussão nas etapas posteriores. E no ensino médio, estagnamos em patamar muito baixo. Recentemente conseguimos consolidar bons exemplos em algumas redes de ensino de médio e de grande porte em regiões pobres que apontam caminhos. Ou seja: conseguimos fazer em algum grau de escala, o que é importante.  Só não fazemos ainda em escala nacional.

Qual deve ser o foco?

Mapeado o que está dando certo, o foco há de estar em definir uma estratégia que toque nas questões centrais que hoje impedem melhorias sistêmicas de qualidade. As regras de governança entre União, estados e municípios precisam ser regulamentadas para dar maior clareza aos papéis de cada um para evitar sobreposições e desarticulação. A estrutura de formação inicial e carreira docente nas redes de ensino precisa ser alvo de mudanças profundas. Também é necessário um financiamento mais redistributivo, que possibilite que todas as redes, em especial aquelas com maiores desafios, tenham condições suficientes para prover uma educação de qualidade. Hoje, é o contrário: em geral, quanto menor o nível socioeconômico da região, menor é a disponibilidade de recursos. E aqui temos uma oportunidade de ouro no futuro próximo: a revisão principal mecanismo de financiamento da educação básica, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que precisará ocorrer até 2020, pode mudar esse cenário.

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Que estratégias os gestores podem adotar para lidar com essas questões?

O problema central é, exatamente, a falta de uma estratégia nacional. Temos políticas federais, estaduais e municipais sem articulação, com sobreposições de responsabilidades e ações. Precisamos é de uma estratégia nacional pactuada entre União, estados e municípios que seja capaz de uni-los em torno de um projeto comum voltado para a aprendizagem e que posicione o professor como aspecto chave de um processo de mudança. Só com a implementação de uma estratégia sistêmica, que reconheça o que precisa ser continuado e aprimorado e ao mesmo tempo consiga introduzir novas medidas necessárias, conseguiremos avançar de maneira significativa.  Esse deve ser o ponto de partida do próximo governo federal.

Os gestores têm dado a atenção que a educação básica merece?

Muito mais do que no passado e isso deve ser destacado como muito relevante para que seja possível promover mudanças estruturantes. O surgimento do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) cumpriu papel importante nesse sentido, a cobertura da mídia também.  É inegável que há certo amadurecimento no debate público e na população de que a má educação nos custa caro. Se em 2013, 60% da população entendia haver relação entre a má qualidade do ensino e o desenvolvimento do país, hoje são 90%%, segundo dados da pesquisa CNI/Ibope. O desafio é que, mesmo assim, a prioridade política ao tema não é um comportamento observado em absolutamente todos os gestores públicos, em todos os níveis. Não fazer mudanças significativas em educação não custa tão caro para um gestor do ponto de vista eleitoral.  Assim, o benefício de promover mudanças ainda é, infelizmente, enxergado como baixo. Por isso que experiências de indução política, como a realizada no Ceará, de atrelar a distribuição da cota parte municipal do ICMS à resultados educacionais devem ser destacadas e replicadas. Com incentivos bem desenhados ali se mudou a forma como prefeitos enxergavam a importância do tema no âmbito da sua gestão.

 

O que o Todos Pela Educação está fazendo nesse sentido?

Há aproximadamente dois anos entendemos que seria relevante tentarmos contribuir com recomendações para o próximo governo federal. Acreditamos que poderá haver uma janela de oportunidade com o início de um novo governo, com capital político, voto fresco.  Mesmo sem saber que será o próximo presidente/grupo político, no início do ano iniciamos a construção do Educação Já!. Juntamos um grupo suprapartidário e plural de especialistas para estruturamos essas recomendações. O saldo do trabalho de seis meses foi surpreendente. Chegamos num documento que traz um diagnóstico bastante detalhado, uma proposta de configuração de uma estratégia nacional, diretrizes de longo prazo e sete medidas prioritárias para o próximo governo.  Houve muita convergência, e mais importante, com profundidade. A partir desse documento, é que então fizemos uma articulação com os principais candidatos à presidência e seus assessores nos últimos meses. Falamos com todos e a recepção foi muito positiva, em especial por conta do processo de construção do documento.  Há interesse de todos em terem acesso a parte 2 do trabalho, que está em andamento e será entregue ao grupo vencedor. Essa segunda etapa está detalhando as propostas para cada uma das sete medidas prioritárias, no nível de proposição de minutas de leis, inclusive.

Como a tecnologia pode auxiliar os profissionais e gestores de educação?

No início dos anos 2000 até não muito tempo atrás, a tecnologia foi vendida por muitos como a tão sonhada “bala de prata” que resolveria os problemas da educação. Não aconteceu e nem tinha como acontecer — a resolução de problemas complexos, tais como os da educação, só se resolvem com uma abordagem sistêmica. A literatura já mostra que em educação, é o efeito da interação entre diferentes medidas que consegue produzir impacto substancial. A tecnologia na educação tem seu papel sim. Ela pode ajudar a tornar a experiência escolar mas engajadora aos alunos, pode apoiar o professor a ter informações sobre a aprendizagem dos seus estudantes de maneira mais rápida e organizada, pode modernizar processos de gestão da política educacional, entre outros. Pode ajudar, mas sem que venha acompanhada de mudanças estruturantes, seu potencial de impacto é minimizado.

Olavo Nogueira Filho é formado em Administração e Empreendedorismo Social pela Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos, com pós-graduação em Gestão Pública no Centro de Liderança Pública (CLP). Trabalhou na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, onde coordenou o projeto Currículo+, dedicado à incorporação de novas tecnologias com fins pedagógicos em mais de 5 mil escolas. Hoje é gerente-geral do Diretor de Políticas Educacionais no Todos pela Educação.

 

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