15/03/2021
Gestão Pública, Primeira Infância.

A primeira infância como prioridade nas políticas públicas: a formação de gestores

Se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda – sintetiza Raffi Cavoukian no documentário “O Começo da Vida”, de Estela Renner. Esta é a razão da mais recente iniciativa do Centro de Liderança Pública, em parceria com a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal: a criação da Rede de Apoio à Primeira Infância, composta por profissionais formados e em formação no Master em Liderança e Gestão Pública, curso de pós-graduação cujo foco é a melhoria do serviço público brasileiro. Esta Rede quer ajudar a mudar o começo da história.

Existem evidências científicas suficientes para justificar a atenção à primeira infância, período que vai do nascimento aos 6 anos de idade. As experiências vividas nesta fase, positivas ou negativas, são levadas para a vida toda e terão efeito sobre o aprendizado, o comportamento e a saúde das crianças até sua vida adulta. Segundo Andrew Meltzoff, psicólogo americano e codiretor do Institute of Learning and Brain Sciences da Universidade de Washington (EUA), os seres humanos aprendem mais – e mais rápido – da gestação aos três anos do que em todo o resto de suas vidas.

Nessa fase são formadas as bases de aprendizado que serão utilizadas durante toda a vida, daí ela ser considerada uma ‘janela de oportunidades’. Frequentar boas creches e pré-escolas, por exemplo, melhora o desempenho escolar futuro, acelera a capacidade cognitiva, aumenta o QI e estimula o comportamento social das crianças. Quando recebem educação de qualidade desde os primeiros anos, elas também costumam apresentar índices menores de hipertensão, doenças cardíacas e obesidade ao longo da vida.

Os investimentos de longo prazo na primeira infância

Pesquisas apresentadas no documento Como investir na Primeira Infância: um guia para a discussão de políticas e a preparação de projetos de desenvolvimento da primeira infância, do Banco Mundial, demonstram que o desenvolvimento adequado das crianças nos primeiros anos – o que inclui acesso à saúde, a um ambiente equilibrado e a um conjunto de interações positivas com seus cuidadores – traz benefícios como menores chances de consumo de álcool e cigarro na adolescência, menores riscos de envolvimento no crime, melhores empregos e maiores salários na vida adulta.

Portanto, oferecer condições favoráveis ao desenvolvimento infantil nos primeiros anos de vida é mais eficaz e gera menos custos do que tentar reverter ou minimizar os problemas mais tarde, como demonstrou o economista James Heckman, vencedor do Nobel em 2000, com a teoria de que para cada dólar investido na primeira infância, há um retorno de 7 dólares na vida adulta.

Em longo prazo, investir na primeira infância é o melhor caminho para diminuir as desigualdades sociais e interromper o ciclo de pobreza das famílias brasileiras.

Se é fato que todo mundo deveria saber disso, os gestores têm o dever não apenas de saber, mas de priorizar a primeira infância na formulação e implementação das diferentes políticas públicas em que atuam. Vale lembrar que o Brasil aprovou, em 2016, o Marco Legal da Primeira Infância, que apresenta diretrizes para essas políticas públicas, estimulando a articulação dos diferentes setores e esferas dos governos para que tenham uma ação conjunta.


Qual o cenário da primeira infância no Brasil?

Em outubro, a Rede Nacional Primeira Infância (RNPI) e a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) lançaram o OBSERVA – Observatório do Marco Legal da Primeira Infância, uma das ferramentas mais completas para o monitoramento das políticas públicas para as crianças de 0 a 6 anos no país, com dados sobre a primeira infância para os 5.570 municípios brasileiros, com foco nas áreas de Assistência Social, Educação e Saúde.

O cenário é de intensa desigualdade na oferta de atendimento à infância, por exemplo na oferta de creche: a média estimada de crianças atendidas é de 29,6% – o que equivale a cerca de 3,5 milhões de crianças fora da creche, com o agravante de que as famílias mais carentes são as que têm menos acesso: 22,4 % carentes e 51,2 % mais ricas, segundo o IBGE.

A boa notícia é que existem iniciativas de sucesso em todas as esferas de governo. E existe o suporte valioso de organizações não governamentais profundamente comprometidas com a causa, que têm sido essenciais na implementação de políticas públicas no país, como o Instituto Alana, a Fundação Bernard van Leer e a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal – que lançou recentemente uma plataforma nacional com diretrizes prioritárias para a concretização da agenda para a primeira infância, com recomendações de como inclui-las nos planos de governo.
Isso significa que há muito a fazer, sim, mas também que já existe um rumo, que já sabemos o que deve ser feito e que estamos em boa companhia.


O que a Rede do MLG vai fazer?

A Rede de Apoio à Primeira Infância reúne os líderes que já atuam ou pretendem atuar na área. São 28 servidores que atuarão a partir de agora, com o apoio da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, para:

Produzir conhecimento sobre o tema, a partir da pesquisa, da análise, da sistematização e do monitoramento das diversas experiências realizadas no Brasil;
Divulgar iniciativas que apresentem soluções eficazes e efetivas para os principais desafios dos primeiros anos de vida, ampliando seu alcance;
Contribuir para a qualificação das políticas públicas destinadas às crianças e seus cuidadores, a partir de uma mobilização que envolva gestores públicos e toda a sociedade.

Com isso, a Rede espera reforçar o time que atua pela primeira infância no país, ajudando a garantir direitos e promover as melhores e mais belas vivências para as crianças brasileiras.

Sylvia Angelini é Diretora de Urbanismo na Prefeitura de Jundiaí (SP) e trabalha atualmente na implantação da Política Pública da Criança na Cidade

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